Satsangs

Pergunta: Querido Prem Baba, como saber o meu propósito na vida, minha missão? Há dois anos deixei o meu posto de alto diretor, o dinheiro, o reconhecimento social, e comecei o caminho do descobrimento interior, mas às vezes tenho medo de ter deixado aquilo.

Sri Prem Baba: Primeiramente quero lembrar alguns pontos: o propósito é o programa de realização da alma, é a maneira como o amor se expressa através de cada um. Portanto, é o amor que realiza o propósito. E realiza de uma forma específica através dos dons e talentos de cada um. Quando o propósito é colocado em movimento, a alma se sente pertencendo. Ela se sente conectada com a fonte da vida, do entusiasmo e da motivação. A pessoa sente a alegria de acordar de manhã porque vê um sentido na vida, pois o propósito dá significado à vida.

É importante compreendermos que existem diferentes grupos de almas que vibram em diferentes níveis de consciência. Cada chakra, ou centro de energia do corpo sutil, determina um nível de consciência. E a alma em evolução nesse planeta se expressa através dos chakras. Existem grupos de almas que estão, nesse momento, com a consciência ancorada no chakra básico. E, no caso dessas almas, o propósito está relacionado à sobrevivência. Esse é o nível vermelho (o chakra básico é representado pela cor vermelha). Muitos grupos sociais e instituições se organizam a partir desse nível de consciência. E por haver diferentes níveis de consciência entre as pessoas dos mesmos grupos, existem conflitos entre elas, já que é impossível que todas estejam no mesmo nível. Vamos supor que você esteja no nível verde, que é no nível do chakra cardíaco, mas, por força do karma, você esteja trabalhando numa empresa de nível vermelho. Nesse caso, você irá se sentir desencaixado, porque sua alma aspira por relações afetivas e por respeito, mas você trabalha num ambiente em que as pessoas colocam a sobrevivência em primeiro lugar.

O rio se move em direção ao oceano, mas ele começa em algum lugar. Em algum lugar a água brota da terra e começa sua jornada em direção ao oceano. E até o rio chegar lá, tem um longo percurso. Existem grupos de almas que estão lá no início do rio e têm grupos de almas que estão chegando ao momento em que o rio se mistura com o oceano. Essas almas têm propósitos diferentes. Me refiro a diferentes expressões do propósito, mas não existe um propósito que seja melhor que o outro. Um eucalipto nasceu para ser um eucalipto, um arbusto nasceu para ser um arbusto. Um arbusto não é melhor que um eucalipto, um eucalipto não é melhor que um arbusto. Os problemas surgem quando você não sabe que é um eucalipto e quer ser um arbusto ou quando não sabe que é um arbusto e quer ser um eucalipto.

Com isso estou querendo dizer que existem almas que vieram para realizar o propósito dentro de uma empresa no mercado financeiro, há pessoas que têm o propósito de dirigir um país, assim como há pessoas com o propósito de contribuir com a ciência ou com a medicina, por exemplo. Todos os campos do conhecimento estão em expansão, o saber é ilimitado. A alma está em expansão. O propósito diz respeito a um programa de realização interno; é a uma contribuição que a alma traz para o projeto evolutivo da coletividade. Às vezes, a sua contribuição é a força física para limpar o chão e receber os buscadores espirituais. Estou dizendo isso para evitar que você crie fantasias a respeito do propósito.

O que você precisa saber é que o propósito é o programa da sua alma, é como uma fragrância do seu Ser. E o que pode contribuir para o acesso a esse programa é o silêncio interior. É quando você pode aquietar as vozes dos eus que te habitam e ficam querendo que você vá para diferentes lugares, com o objetivo de agradar um ou outro. Esses diversos eus que habitam a entidade humana em evolução, constituem aquilo que na psicologia, é conhecido como ego. Embora a raiz do ego seja a ideia de eu e embora ele pareça ser uma entidade única, essa percepção é ilusória. Na verdade, o ego é uma multidão. São muitos eus e muitas vozes que nascem da ideia de eu. E, muitas vezes, o seu fazer no mundo se coloca a serviço dessas vozes. Você quer agradar à família, à sociedade, à religião, mas essas são vozes que precisam silenciar para que você possa ouvir o seu coração.

Quem mais estimula essas vozes que te impedem de ouvir o coração é o medo e o ódio. E, no que diz respeito ao compartilhamento dos seus tesouros e à doação dos presentes que você trouxe para o mundo, quem te impede é a raiva do outro.

É importante compreender que o propósito da sua alma não pode se revelar enquanto você estiver com raiva do outro, pois o propósito diz respeito a fazer o outro feliz. Sempre, independentemente do propósito ser varrer o chão, cozinhar, conduzir uma empresa, trabalhar com cura, com comunicação ou até mesmo servir o guru. O propósito sempre diz respeito a contribuir com o despertar da consciência; sempre diz respeito a fazer o outro feliz. Se você não quer que o outro seja feliz, pois seu sistema está envenenado de raiva e você está identificado com esse aspecto do corpo ilusório, então não haverá consciência do propósito.

Quando entra nessa casa do jogo da vida e começa a questionar qual a razão de ter nascido, mas ainda carrega muita raiva e se identifica com um aspecto do ego que ainda se revolta e briga com a vida, inevitavelmente você entra em processo de purificação. Se você foi movido a largar seu trabalho pelo coração, por estar completamente insatisfeito e infeliz, e por isso teve a coragem de romper e mudar o caminho que havia escolhido, você terá que passar por um processo de purificação até que possa se afinar com as dimensões do amor e silencie o suficiente para dar passagem à consciência do propósito.

Nesse caminho, em algum momento, você se valerá da oração. Peça para o seu Eu real se revelar. Diga: “Revela-Te, mostra-me a que veio”. Essa é uma maneira de pedir que a Existência revele onde ela quer que você esteja. “Onde Você quer que eu esteja? O que Você quer de mim?”. E, quando fizer esse pedido, você deve ter a humildade de aceitar o comando.

Essa é uma questão que angustia muita gente, especialmente as pessoas que começaram o processo de despertar, que é sinônimo de desamortecimento. Elas começaram a remover a armadura e a se curar da normose - que é o estado hipnótico da normalidade, no qual a entidade se amortece basicamente com comida, sexo e dinheiro -  e começaram a questionar a razão da existência: “Quem sou eu? O que vim fazer nesse mundo? Para onde estou indo?”. Para essas pessoas, a questão do propósito começa a se tornar realmente muito urgente, pois a inconsciência a respeito disso gera sintomas extremamente desagradáveis, entre eles um terrível sentimento de desencaixe. Isso gera uma angústia profunda e torna-se muito difícil viver dessa maneira.

Encontrar uma resposta para a pergunta “qual é o meu propósito?” ou “Para que eu nasci?” se torna vital e ao mesmo tempo não é algo que se revele somente a partir da vontade consciente, mas sim a partir da consciência do Ser. Na medida em que você vai largando os pensamentos e se libertando do sistema de crenças (o que equivale a se desfazer das máscaras) e começa a se identificar com o Ser que é o seu Eu real, a consciência do propósito se revela.

Portanto, é verdade que a consciência do propósito vem com a maturidade. Antes que você esteja suficientemente maduro, o que você pode fazer é provocar a maturidade. Você pode se mover em direção à consciência do propósito. Mas sugiro que você não crie ansiedade com relação a isso, porque essa consciência é como um florescimento. E a forma como o propósito se manifesta no mundo também vai se transformando.

Eu, por exemplo, tive o bom karma de conhecer meu propósito muito cedo, mas ele foi se transformando ao longo da jornada. Comecei dando aulas de yoga, depois comecei a usar a medicina natural, o xamanismo e a psicologia. Foi uma evolução do denso para o sutil, mas sempre trabalhei pelo despertar da consciência, mesmo quando não tinha consciência disso.

Você é o rio que corre em direção ao oceano. Às vezes você está lá perto da nascente, às vezes, no meio do percurso, e às vezes, está bem perto do oceano. Onde quer que esteja, quanto mais consciência de quem é você e do que veio fazer aqui, mais encaixado você se sente e mais tem a chance de desvendar outros mistérios da existência, por que o propósito funciona como um portal interdimensional.

O propósito do ser humano é sempre amar. Assim como o propósito do sol é iluminar, o da água é saciar a sede, o da abelha é polinizar a flor, o propósito da alma humana é amar. Mas amar de uma forma bastante específica, amar através dos seus dons e talentos. Por isso o propósito é sempre único; ele é a forma particular pela qual o amor se expressa através de cada um. Muitos têm o propósito de cozinhar, mas cada uma vai cozinhar de um jeito. Então, vamos supor que o propósito daquela alma seja amar através da dança. Quando ela está consciente desse propósito e já está podendo manifestá-lo externamente, ou seja, o programa da sua alma se tornou o seu trabalho no mundo, então ela começa a enxergar muitos outros aspectos desse dharma  específico (propósito ou missão). É como se ela tivesse a chance de acessar diferentes dimensões da dança. Por exemplo, ela poderá curar, levar alegria e leveza para as outras pessoas através dessa atividade. A consciência do propósito permite que ela abra novos canais e permite que o amor se expresse das mais diferentes maneiras. O saber é infinito.

Quando a pessoa está encaixada no seu lugar e já pôde se libertar do medo da escassez e se harmonizar com a lei do mínimo esforço; quando ela se afinou com os códigos divinos da prosperidade, da abundância e da confiança (que são desdobramentos da manifestação do seu propósito interno no mundo); quando deixou de desperdiçar seu tempo com a sobrevivência, tentando resolver os problemas de fora para dentro; quando conseguiu se libertar desse estresse, dessa tensão que é a luta pela sobrevivência (que existem por que você ainda não está manifestando o propósito interno na matéria); quando você se liberta disso tudo, um profundo relaxamento, uma calma surge. É como se abrissem sua visão espiritual, ampliassem sua percepção, e você mergulha no mistério que é o seu propósito.

Outro exemplo: Vamos supor que o propósito seja uma contribuição no mercado financeiro. Se a pessoa está em sintonia com o fluxo da vida, ela tem acesso à fonte da criatividade e dará passagem para tantas ideias inovadoras, que vão contribuir para o desenvolvimento e a expansão da coletividade. Ela se torna um canal de bênçãos.

Quando você se identifica com o Ser e permite que ele se expresse através de você, esse processo se torna natural. Às vezes, você já acessou o Ser e consequentemente a consciência do propósito; e se já está colocando o propósito em movimento no mundo, mas ainda não está tendo suas necessidades materiais atendidas, porque o karma na área financeira é muito grande, um tempo maior será necessário para que a luz do Ser dissolva esse karma. Mas, nesse caso, você tem confiança de que está no lugar certo, na hora certa, e de que tudo que precisa chegará.

Uma das pedras mais preciosas que nasce do alinhamento com o propósito é a libertação do medo da falta – medo de passar fome e de não ter “onde cair morto”. Sem dúvida, esse é um dos principais terrores da vida humana.

Pergunta: Amado guruji, ontem você falou bastante das máscaras e como elas impedem a manifestação do nosso propósito. Há um tempo, em um dos seus retiros, identifiquei a minha máscara de devota. Visto minha mãe ser tão religiosa, era um modo de receber o seu amor, me fazendo de devota. No entanto, aqui com você, não consigo pensar em outra coisa a não ser te servir. Viver essa rotina do ashram para mim é como vivenciar o céu na terra. Só consigo pensar em viver minha vida para você e permanecer a seus pés. Estou ainda muito na ilusão, guru ji?

Prem Baba: É possível que você retire a máscara da devota e encontre a devota. É possível que você remova a máscara da religiosa e encontre a religiosa. Muitas vezes a mentira e a verdade andam juntas. Você pode estar no lugar certo e só precisa mesmo de um ajuste.

Algumas pessoas estão completamente desencaixadas e a remoção das máscaras pode significar um verdadeiro desmoronamento na vida. Elas vivem uma vida de mentira: o trabalho é mentira, o casamento é mentira - tudo é mentira – e o que vieram fazer aqui é algo completamente diferente do que têm feito. Se o seu propósito implica em estar no Himalaia e você está em Nova Iorque, talvez você tenha severos desafios pela frente. Algumas pessoas vieram para estar no Himalaia e já estão no Himalaia; outras vieram para estar em Nova Iorque e já estão lá. Tudo é uma questão de consciência e mudança interna de foco. Muitas vezes, não é necessária uma mudança na maneira de viver a vida ou uma mudança de morada – é apenas uma questão de agir a partir da verdade do Ser e não a partir da máscara.

Independentemente de estar identificada com a máscara ou com o Ser, não há lugar melhor para estar no mundo do que junto com seu mestre. O serviço para o mestre é, sem dúvida, uma oportunidade rara de liberação dos karmas, em todos os sentidos. E também foi o karma que possibilitou essa chance de estar perto do seu mestre. Precisamos reconhecer esse aspecto da verdade: você é merecedor de estar aqui e agora. Isso é um grande merecimento. Quantos bilhões de pessoas neste mundo, neste momento, estão se debatendo, procurando por uma luz, por uma guiança; buscando uma maneira de ir além do sofrimento? E você, por mais que esteja sofrendo, conseguiu chegar até aqui. E aqui estamos tendo a chance de falar sobre esse assunto abertamente, podendo olhar para essas questões todas de frente. Eu considero isso uma grande sorte.

Quando encontrei meu guru e tomei consciência do que havia encontrado, eu pensei: “Ganhei na loteria, sozinho!”. Eu realmente tive essa sensação. Fiquei um tempo sozinho dando risada e dançando, tomado de alegria, completamente louco – loucura divina. Por que eu havia encontrado a luz no meio de toda essa escuridão. Essa é a minha experiência.

Eu sinto que é uma questão de tempo para que a consciência do propósito se revele. Enquanto isso, você vai servindo e aprendendo a lidar com a mente. A mente vai gritar como uma multidão de macacos. Ela vai tentar te convencer que tem algo errado com você e que há outras coisas mais importantes a fazer. Mas, se você não dá atenção para a mente, ela cala a boca rapidinho. Não dê atenção para ela, se firme no Ser. Uma das formas de firmar no Ser é a devoção ao seu mestre espiritual. Esse foi o método que eu utilizei enquanto sadhaka, buscador espiritual. E funcionou.

Às vezes, o seu propósito é cuidar de uma criança, uma família, ou prover uma família. Alguns têm muitos propósitos. Dentro do seu propósito, há diversos propósitos. Por exemplo, este ano, faz parte do meu propósito ajudar as pessoas a se alinharem com os seus propósitos. Dentro do propósito maior, que é iluminar a alma humana e fazer ajustes na sociedade, eu tenho o propósito de, em 2017, ajudar aqueles que estão conectados comigo a acordarem a consciência do seu propósito. Vou dar o meu melhor para isso.

Estou tentando ser o mais didático possível porque vejo, especialmente nesse grupo de almas que são dos buscadores espirituais, muita fantasia a respeito do propósito. Muitos pensam que vieram fazer algo muito grandioso. Querem realizar um grande projeto de transformação social ou tornarem-se terapeutas. É incrível como nove entre dez buscadores querem ser terapeutas, pois acreditam que esse é único meio de fazer o outro feliz, o único meio de ser canal do amor, e isso é ilusório.

Em relação a esse assunto, a última dica que dou é: quando se perceber insatisfeito com o seu trabalho no mundo, não saia correndo para fazer outra coisa. Espere um pouco. Pare e respire primeiro. Talvez você tire a máscara e veja que está fazendo a coisa certa. Tente não cair na armadilha da ansiedade. Tenha calma e abra espaço e tempo para a revelação de quem é você. E, quando as coisas ficarem mais claras, você toma uma atitude.

Esse é o meu principal conselho: acalme-se. Relaxe. Não precisa correr atrás de nada. Venha até aqui pela manhã, sente-se, cante um pouco e ouça uma coisa ou outra. Isso é o suficiente. Tudo está acontecendo sem que você tenha que controlar. Não aprece o rio, apenas esteja aqui de verdade. O melhor que você pode fazer é estar total na sua ação. Você está no campo da Graça. Tenha calma, eu estou cuidando de você. Apenas esteja completamente atento.

A criança já chega sabendo do propósito, e com o tempo ela vai esquecendo. Por conta da repressão, ela é levada a ficar na mente. Quando você era criança o que queria ser quando crescesse? Quais eram seus heróis? São sinais importantes, que devem ser considerados. Quando eu era criança, sabe o que eu queria? Voar. Eu cantava assim: “Livre, assim como a brisa”. Queria ser livre. Vim sabendo que nada, nem ninguém, me prenderia. E você? Pra que você nasceu?

Quem me lembrou do meu propósito foi meu guru, ele falou através da Ganga, que disse: “Veja como eu sou livre, a nada me apego”. Tenho devoção pela Ganga, por isso meu guru me deu esse terreno bem na frente dela.

A Ganga corre no meu coração

Leva com ela toda ilusão

Só pode ser uma Presença divina

Força do bem, força que me domina

A Ganga é uma mãe preciosa

Lava em suas águas minhas vidas passadas

Leva pra longe, ó mãe dadivosa

Todas as mágoas e todos os karmas

Olhando com os olhos da matéria, vemos somente um rio. Olhando para a água com os olhos da matéria, vemos apenas dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio – H2O.

Vamos seguir nossa afinação com o espírito, nossa afinação com o Ser. Vamos cantar um pouco:

O dharma do beija-flor é beijar de flor em flor

O dharma da abelhinha é polinizar a florzinha

O dharma da lagarta é se transformar

E virar uma borboleta a voar, voar, voar

O dharma do sol é nos iluminar

O dharma da estrelinha é brilhar, brilhar, brilhar.

O dharma da lua é nos encantar

E qual é o nosso dharma?

O nosso dharma é amar

Amar todos os irmãos e realizar

Que Deus está em todos e em todo lugar

Abençoado seja cada um de vocês. Que a consciência do propósito se revele. Que a razão do seu nascimento se revele. Até nosso próximo encontro.

NAMASTE

‍