Prem Baba transmite seus ensinamentos ao redor do mundo, por meio de encontros presenciais e virtuais.
Nessa sessão você encontrará alguns de seus “satsangs”(palavra Hindi que pode ser interpretada como palestra) descritos.
Você pode filtrar por palavras chave ou temas e acessar o conteúdo transcrito.
Distorção do masculino. Distorção do feminino. Luxúria como forma de dominar o outro. Identificação com a criança ferida. O impacto do desamor. A violência como mecanismo de defesa. Padrões de codependência. Ciclo vicioso do sadomasoquismo. Autoconhecimento como política pública. Reparação das relações familiares. Amor como único remédio para a humanidade.
Meu pai, meu pai, meu pai, meu pai que tem amor,
Meu pai, meu pai, meu pai, meu pai que é puro amor,
A vida eu sinto em razão do meu pai que é puro amor,
A vida eu vivo em razão do meu pai que é puro amor.
Eu afirmo (posso até mesmo prometer) que, em algum momento na sua jornada, você vai realizar as palavras dessa canção. Independentemente de todas as misérias que viveu junto aos seus pais, independentemente de todos os choques de desamor, eu posso afirmar que, em algum momento, você vai se desidentificar dessa criança machucada e enxergará a luz que habita nos seus pais e irá se render a essa luz. Independentemente de tudo que a sua personalidade passou, de tudo que o seu corpo sofreu, em algum momento, de alguma maneira, você vai cantar:
O meu pai é maravilha, minha mãe é um primor,
Sou filho abençoado do mistério do amor.
Você é um filho abençoado do mistério do amor. Você é uma manifestação do amor divino. Embora neste momento, talvez, a sua mente esteja identificada com uma história de dificuldades. Talvez neste momento você esteja tendo um sonho ruim, no qual acredita não ser merecedor do êxtase de estar vivo. Mas eu posso lhe prometer que, em algum momento, você acordará desse sonho. Em algum momento, você deixará de sonhá-lo, pois ele é a causa de muito sofrimento. E esse momento pode ser agora. O tempo faz parte do sonho, portanto, é relativo.
Por exemplo, você me pergunta assim: Querido Prem Baba, como distinguir a luxúria e a atração natural entre os sexos? Por vezes, sinto que minha relação com as mulheres tem sido desrespeitosa.
Sri Prem Baba: Fico feliz que você esteja acordando desse sonho de violência contra o feminino. Mesmo que, entre a percepção do sintoma, o autodiagnóstico, e a cura haja um longo caminho, é verdade que, ao tomar consciência do sintoma e se mover em direção ao diagnóstico, você começa a bater na porta do salão da verdade para compreender o porquê do sintoma. Nesse momento já se iniciou o processo de cura. Iniciou-se o processo do despertar, mesmo que ainda possa levar algum tempo até que a cura se complete.
Esse sintoma me faz refletir a respeito do poder do desamor neste mundo. Como a falta de amor de uma mãe pode causar tantos danos; como a falta de amor de um pai pode causar tanto impacto na existência. Como o desamor pode impactar toda uma dimensão da existência.
Embora eu afirme que você é uma manifestação do amor divino, não podemos subestimar o poder Mahamaya, a ilusão cósmica. Trata-se de um poder que tem autonomia e age como uma entidade. Mahamaya é um termo utilizado na tradição hindu que representa a sombra do feminino, cujo principal aspecto é o desamor, a ausência do acolhimento, ausência da gentileza. E uma ausência de acolhimento e gentileza com um ser que você trouxe ao mundo.
Às vezes o desamor se manifesta na forma de um ódio bem objetivo, mas pode se manifestar em graus mais sutis. Independentemente do grau do ódio (se é apenas uma irritação, uma falta de presença, um descaso, uma falta de cuidado, ou se você quer ver o outro se acabar) essa vibração emana de você e causa algum impacto. Muitas vezes, o ódio é transmitido através do leite materno. Esse leite funciona como um veneno. O leite materno é o principal alimento da criança, é o alimento mais completo para ela. Quando esse leite é carregado de amor e de afeto, ele se transforma num néctar que acorda o amor naquela alma, mas quando está envenenado de ódio, inevitavelmente isso é transmitido à criança e acaba condenando essa alma a experiências miseráveis. A dor gerada pelo desamor faz com que a entidade desenvolva a violência como forma de proteção. A violência, em todas as suas manifestações, é um mecanismo de defesa.
Estamos focalizando apenas um aspecto sutil da violência. Você está começando a perceber que desrespeita a mulher, mas isso é apenas um aspecto de uma enorme ferida planetária – talvez a maior delas. Segundo uma pesquisa, no Brasil, a cada dois minutos, cinco mulheres são abusadas. Aqui na Índia, a cada vinte minutos, uma mulher sofre violência sexual, estupro. Mas eu duvido desse número e posso afirmar que está errado, porque muitas mulheres não têm coragem de falar sobre o que acontece. Elas não conseguem ir à delegacia e denunciar o agressor, porque são ridicularizadas pelos policiais. Elas acabam não tendo coragem de pedir ajuda, porque correm o risco de novamente sofrer um abuso.
Brasil e Índia são dois polos nos quais essas coisas estão mais verificáveis no momento, mas trata-se de um fenômeno global. A distorção do masculino e a distorção do feminino estão presentes em toda a raça humana. Ambas as distorções geram violência. Elas criam um intimidador e um intimidado. A distorção do feminino gera um tipo de violência passiva, uma violência que se deixa intimidar e acaba se tornando dependente dessa violência para obter um certo domínio do masculino. Estou me referindo à submissão, que é o aspecto da distorção do feminino. Ela se torna dependente do desrespeito, que é a distorção do masculino.
Estamos falando de padrões de codependência que estão enraizados nas nossas células e, para que possamos nos libertar disso, precisamos de tempo. E precisaremos tomar a medicação correta: autoconhecimento e cultivo do silêncio, pois esses são instrumentos que possibilitam a expansão da consciência e o despertar desse sonho ruim, no qual você acredita ser alguém somente quando machuca ou quando é machucado. Nesse sonho, você só é forte quando alguém se machuca, mesmo que esse alguém seja você. Não é possível machucar o outro sem se machucar, assim como não é possível se machucar sem machucar o outro, por que, em última análise, o outro não existe; ele é uma projeção do seu psiquismo.
A luxúria é a necessidade de machucar o outro através da energia sexual. É quando você usa a energia sexual para dominar e retirar o poder do outro. Você suga a energia dele. Muitas vezes, luxúria e amor andam juntos por que, neste mundo, a verdade e a mentira se entrelaçam e isso torna a experiência humana ainda mais desafiadora.
Você odeia a pessoa que ama. Talvez esse seja o maior dos paradoxos. E para piorar, você sente culpa por odiar essa pessoa que ama, e a culpa faz você se punir. Dessa forma, você se torna prisioneiro de um círculo vicioso do sadomasoquismo. Essa é a grande estratégia de Mahamaya. É assim que você fica preso na sombra.
Você diz que começou a acordar, pois começou a perceber que está sendo canal da violência. Você percebeu que está desrespeitando e assim começou a se mover em direção ao respeito, mesmo que isso ainda leve um tempo.
Falando fenômeno como algo coletivo, percebo que só haverá uma mudança de consciência se o autoconhecimento se tornar política pública. O remédio só terá efeito para a sociedade se estiver presente na água que bebemos. Vejo que, talvez um caminho para que as lideranças políticas e financeiras mundiais compreendam a necessidade de mudança de paradigma (o que significa deixar de tratar os sintomas e ir diretamente à causa da doença) seja tomar consciência do alto custo financeiro que a violência tem. A violência custa caro. Na última pesquisa que li, a violência custou para o Brasil, em 2014, quase 100 bilhões de dólares, ou seja, quase 258 bilhões de reais. Para um país que passa fome; um país em que as pessoas não têm acesso à saúde básica; um país onde as pessoas não têm um mínimo para viver decentemente, esse custo é muito alto. Não podemos gastar quase 100 bilhões de dólares com a violência. Os desdobramentos disso são incontáveis, incluindo o que se gasta com sistemas de segurança.
Estou dando o exemplo do Brasil porque é o país de onde venho e sobre o qual tenho um pouco mais de informação, mas tenho absoluta certeza de que isso também acontece em outros países do mundo. A economia se baseia no medo da escassez e, no mais profundo, existe o medo de se machucar, o medo da violência. Então, o dinheiro é utilizado para se proteger.
Esse é o impacto do desamor. Despertar o amor tornou-se absolutamente urgente. Perceba que essa é a única saída para a espécie humana. Chegamos nesse estágio porque nos esvaziamos de compaixão. E esse é o único remédio para este planeta. A compaixão é uma dimensão do amor. Mas, para acordar essa virtude, precisamos acordar desse sonho ruim, no qual acreditamos ser qualquer coisa, menos o amor.
Se você é o amor, de onde vem essa necessidade de desrespeitar o outro? Com certeza não vem do seu centro, não vem do seu eu real. Isso vem de algum aspecto da sua personalidade que ainda está machucado. Por isso tenho insistido e frisado tanto sobre a importância de reparar as relações, especialmente as relações com familiares, especialmente com mãe e pai. Enquanto carregar revolta dentro de si; enquanto carregar vingança no seu coração, isso vai continuar se reproduzindo nos seus relacionamentos. Isso é matemática psíquica básica.
Ao mesmo tempo, sei que nem sempre é fácil realizar essa reparação. Para alguns, é até mesmo impossível. Mesmo que neste mundo haja cura para tudo, não sabemos quando ela ocorrerá. Não podemos determinar o tempo. Mas como disse, o tempo é relativo; é um aspecto da grande ilusão. Quem sabe aqui e agora você possa soltar esse pacto de vingança. Quem sabe aqui e agora você possa renunciar essa história, na qual você foi desrespeitado, machucado, e por isso precisa machucar e desrespeitar para continuar o ciclo de sofrimento. Quem sabe aqui e agora você possa renascer no espírito. Quem sabe aqui e agora você possa querer ver o bem do outro. E, nesse caso específico, o bem da mulher: “Eu quero que você seja feliz. Quero te ver brilhar”.
Você se sente ameaçado com o brilho da mulher. Quem é essa mulher de quem você precisa apagar o brilho para se sentir seguro? Quem é essa mulher que você precisa colocar para baixo para se sentir forte? Quem será? Busque dentro de você. Quem é essa figura que está roubando a cena da sua história e que, posso dizer, está roubando a cena da sua vida? Que está fazendo você desperdiçar aquilo de mais precioso que você tem, que é o tempo, sofrendo?
Awaken, Awaken Love! Awaken Love!
Olhar para a doença de uma forma tão profunda pode despertar sentimentos difíceis de ser administrados. Às vezes você pode cair na armadilha da culpa. Fique atento para não cair nela, por que dessa forma você está caindo em mais um sonho, no qual acredita ser uma vítima.
O meu pai é maravilha, minha mãe é um primor,
Sou filho abençoado do mistério do amor.
Experimente cantar essa música realmente sentindo. Talvez seja o primeiro passo para ir além da identificação com a sua criança machucada. Talvez esse seja o primeiro passo para você ver que a sombra é apenas um véu e assim poder ver o que está por trás dele.
O véu é uma ilusão, mas às vezes causa um grande estrago. E pode levar tempo para você cantar de verdade. Mas quem sabe você possa cantar de verdade agora.
Mesmo que a personalidade esteja cheia de ódio. Perceba que, depois de chorar todas as lágrimas que tem que chorar; depois de botar para fora toda a raiva guardada, o que vai te libertar mesmo é se desidentificar da sua história; é você se desidentificar da criança machucada. O que te liberta é uma mudança de identificação. E aí surge uma pergunta: com qual parte da sua personalidade você está identificado?
Eu lhe convido a se aprofundar no processo de autoinvestigação, que é a principal ferramenta para a cura psicoespiritual. É como se você o tempo inteiro se perguntasse: “Quem sou eu? Quem em mim desrespeita a mulher? Quem em mim desrespeita o homem? Por que eu preciso desrespeitar? De onde vem isso dentro de mim?”. Procure identificar onde você está amarrado e então trabalhe para se libertar. Desamarre esses nós. Para desamarrar talvez você tenha que chorar um tanto; talvez tenha que botar a raiva para fora. Porque, às vezes, perdoar não é uma coisa tão simples. Virar a página, de verdade, às vezes requer bastante trabalho. Perdoar significa virar a página mesmo, para sempre. Acabou. E se aquela situação do passado acabou, não existe repetição agora nos seus relacionamentos. Às vezes você se engana, achando que está tudo resolvido, mas continua machucando aquela pessoa que está perto de você. Esse é o famoso autoengano. Mas, muitas vezes, uma dose de autoengano é tudo o que você quer para poder sentir-se um pouco melhor. Porém, o preço para acordar é nenhum autoengano. O preço é não estabelecer nenhuma aliança com o pequeno eu. O preço é romper com toda mentira. Assim, devagarinho você vai se permitindo mudar o foco da identificação.
Saiba, meu amado amigo, que a identificação com a criança machucada dentro de você, ou a identificação com esse pacto de vingança, é a âncora que te segura no inferno. Isso é o que te impede de subir. Por mais desagradável que seja essa tomada de consciência, essa transição, seguimos nos movendo da morte para a imortalidade, do veneno para o néctar, da mentira para a verdade. É assim. De repente alguém abre os olhos: “compreendi!” Aí outro: “compreendi!” Aí outro: “compreendi!” Essa compreensão vai se espalhando e vai fortalecendo o nosso campo budhico, a nossa bolha de despertamento do amor.
Abençoado seja cada um de vocês. Que possamos erradicar completamente a violência do nosso coração. Até um próximo encontro.
NAMASTE